Pular para o conteúdo principal

HÁ UM CORINGA DENTRO DE CADA UM


Há um Coringa dentro de cada um. Aceitar e controlar esse Coringa interno é o que nos torna seres plenos


por Luciano Cazz 

Todos nós temos um Coringa dentro da gente a ponto de explodir…

O filme “O Coringa” expõe uma ferida que todos têm na alma. Na verdade, joga na nossa cara todas as mazelas escondidas atrás dos sorrisos amarelos e das alegrias forjadas.

Nosso Coringa interno guarda todas as rejeições que sofremos durante a vida. De pais que nos abandonaram ou falharam no amor e proteção e de todos os familiares perversos. Rejeição das tantas paixões que nos desdenharam, dos grupos que nos excluíram e dos momentos em que não fomos escolhidos nem convidados.

O Coringa de cada um não sofre de amnésia. Todos nós temos um Coringa dentro da gente a ponto de explodir.

Nosso Coringa engole a seco todas as humilhações que suportamos dentro de casa ou na rua, todas as risadas da nossa cara, todo deboche cruel. Ele segura no tranco as dores do bullying, que nada mais é do que pisotear em fraquezas ou defeitos para fazer graça como um patético Joker.

O Coringa que vive dentro de cada um tem na memória cada detalhe de todos os abusos que já sofreu. Quando seu corpo foi violado pelo desejo do outro ou por tapas, tem registrado todos os atentados de uma violência psicológica que não se entende nem se mede, mas da qual o seu Coringa jamais se esquecerá. E, por mais que você acredite que tenha superado, lá no fundo, bem escondido no seu íntimo, ele sofre por todas as traições sofridas, todas as confianças quebradas e os afetos que tentou dar, mas foram jogados no lixo. Ele guarda dolorosamente a forte sensação de impotência diante das frustrações da vida e até das injustiças sociais e políticas.

Ou talvez nem guarde tão bem assim e deixe escapar na violência doméstica ou no ardiloso usufruto do poder, nos vícios e nas promiscuidades, na falsidade e nas mentiras, nos julgamentos equivocados e nos destemperos exagerados, nos egoísmos e nas corrupções do dia a dia, e na falta de empatia que impera em uma sociedade, cujo ego infla com a frustração do próximo.

E, assim, não implodimos. Nos pequenos delitos, deixamos escapar um pouco do nosso Coringa, como um balão de que a gente libera um pouco de ar para não estourar. Então, a gente pune o outro com maldades e sorridentes boicotes pela inveja que nos causa. Jogamos nele as nossas frustrações e o condenamos a um rótulo que é nosso. Competimos com todo mundo por troféu nenhum, atrás de uma autoafirmação do nosso Coringa, mesmo que em cima da infelicidade de quem estimamos.

Somos todos palhaços de um mundo de aparências que finge ser politicamente correto, com a bolota redonda e vermelha na ponta do nariz.

Porque, por trás da maquiagem colorida das nossas personalidades virtuais, somos todos sozinhos em nossos sentimentos verdadeiros e amargos no reconhecimento que não temos e negamos às pessoas quando sofremos pelo sucesso do outro, e desejamos, secretamente, mesmo que por um momento, o seu pior.

O sorriso do Coringa desmascara uma sociedade que simula felicidade, entretanto, vive insatisfeita, depressiva ou ansiosa. Que só quer falar sem saber escutar, receber sem saber dar. Saber mais, ter mais, ser mais mesmo que de mentira. Que sofre ao ajudar o próximo e finge não ver as qualidades alheias.

No momento da virada do filme, o Coringa não se liberta do desespero, mas aprisiona-se. Ele perde o controle sobre a dor para a loucura da verdade humana. A frieza é uma culpa gigantesca que tomou conta de tudo. Ela não tem contraponto e se perde no “não sentir.” Então, pisar nos outros é afrouxar a corda em volta do próprio pescoço, porque a dor que causamos é a mesma de que desesperadamente queremos nos livrar, da mesma forma que o narcisismo é o retorno de uma interpretação extremamente feia que temos de nós mesmos.

Segundo Freud, a psique se forma em cima do conflito. Mas se o Coringa dentro de nós é natural e inevitável, como fazer para não enlouquecer?

Os instintos não se desfazem, um dia, de uma forma ou de outra, virão à tona, então, para não implodir e aliviar o seu Coringa, procure subterfúgios sadios. Uma luta, um hobby, a arte ou uma religião, a natureza. Viaje, faça terapia. Procure razões para gargalhar de verdade, diga os “nãos” que calou, os sins que se acovardou. Ou quem sabe tudo isso junto, mas deixe os outros em paz. Pare de fazer, de quem não tem culpa nenhuma, o seu tapete para esconder debaixo dele todas as suas frustrações. Encare-se no seu espelho e foque em se esvair dos rancores escondidos na sua alma.

Perdoe aqueles que se deixaram levar por sua própria loucura e lhe fizeram mal. Mas, mais do que isso, perdoe-se! Por não ter se defendido, por sua ingenuidade, por não ter dito “não”, por ter baixado a cabeça, por todas as vezes que chorou em vez de reagir e que alimentou o seu Coringa, engolindo sapos. Neste mundo torto, foi a maneira que você encontrou de sobreviver, mesmo assim, afasta-se de quem lhe subestima, como o Coringa não fez, com sanidade.

E, caso se identifique com o monstro, principalmente, no momento em que ele vinga o bullying, não se preocupe nem sinta culpa, é só um pouco da pressão saindo, pois ele está em você, mas você está no controle. E, só assim, aceitando e controlando, o seu Coringa interno, é que você se tornará um ser pleno.

E, quem sabe em um futuro não muito distante, o sistema respeite mais a nossa humanidade e, então, em uma civilização mais evoluída e madura, seremos capazes de conciliar melhor os instintos biológicos com os deveres sociais, com menos recalques e mais respeito à expressão individual, e, por conseguinte, tirar a máscara do palhaço para, finalmente, sermos bons de verdade, como de fato somos. 

Fonte: site  "O Segredo"

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

4ª EDIÇÃO DO BARALHARTE - DISCUSSÃO DE TEMAIS DA ATUALIDADE

Ontem, sábado, aconteceu a 4ª edição do BARALHARTE!  Trata-se de um encontro de debatedores sobre quatro temas atuais, representados pelos quatro naipes do baralho e por quatro regiões diferentes de nosso país. Cada debatedor leva um tema que será debatido pelos demais e também por convidados presentes. Os debatedores desta edição foram eu, Luciana, representando o estado do Rio de Janeiro, Gilvaldo Quinzeiro, representando o Maranhão e Amaro Poeta, representando Pernambuco. Fernanda Analu, representando Santa Catarina, em razão de um compromisso de última hora, não pôde participar. Mas contamos também com as convidadas Mirtzi Lima Ribeiro e Valéria Kataki e com os convidados Hairon Herbert, Julimar Silva, Ricardo Vianna Hoffmann e Tarciso Martins. Agradeço a Gilvaldo Quinzeiro pelo convite e pela oportunidade de participar de um encontro tão engrandecedor, oportunidade que temos para aprender muito sobre variados assuntos. Cliquem abaixo para assistir: Luciana G. Rugani

POESIA PARA DUAS IRMÃS

Duas irmãs, Dois corações, Duas almas que trilham o mesmo caminho: de amor, fé e união. Impossível tratar aqui só de uma delas, Suas histórias se completam. Nos olhos de uma vejo a alegria que se estampa no sorriso da outra, No abraço de uma sinto o acolhimento que se estende à presença da outra. Duas almas plenas de sensibilidade, Que sabem amar e viver com alegria, Que sabem cultivar a luz nos seus dias, E, ainda que chegue a noite, Será sempre iluminada pelas estrelas. Porque a escuridão nada é, Perante a força que emana dessa união. Luciana G. Rugani

POEMA CIGANO

Navegando pela internet encontrei uma música cigana francesa simplesmente maravilhosa: "Parlez Moi D'elle", cantada por Ricão. Encontrei também um poema cigano encantador! Escolhi ambos para compor essa minha postagem que fica como uma singela homenagem ao povo cigano. Abaixo da foto segue o vídeo com a música e o poema logo abaixo. Assistam ao vídeo e leiam o poema. São maravilhosos! POEMA CIGANO Sou como o vento livre a voar. Sou como folha solta, a dançar no ar. Sou como uma nuvem que corre ligeira. Trago um doce fascínio em meu olhar. Sou como a brisa do mar, que chega bem de mansinho. Sou réstia de sol nascente, sou uma cigana andarilha. O mundo é a minha morada, faço dela minha alegria. A relva é a minha cama macia, meu aconchego ao luar. Acendo a luz das estrelas, salpico de lume o céu. Sou livre, leve e solta, meu caminho é o coração. Sou musica, sou canção, sou um violino à tocar. Sou como fogo na fogueira, sou labaredas inquietas. Sou alegre, sou festeira, trago...